segunda-feira, 23 de junho de 2008

obra-prima do tempo

Quebrando espelhos
deixo restos reversos e rezo,
raso de todo o fervor de tempos antigos.
Me pego tocando as marcas
truculentas, antes deleitosas
e doces
hoje amarguradas cascas
que revestem meu corpo,
invólucro do vácuo
que se fez minha estada aqui.
Oco e uniforme, sem saliências
ou solturas.
Me pego vago entre os cômodos da casa
e me acomodo nessa forma incômoda
tocando o ventre grosso,
e as partes do corpo hoje disforme.
As pontas dos pêlos me doem.
As pontas dos dedos me moem.
Os fios brancos me remoem
o passado de grave gozo.
Brigo com a memória
e teimo em afastar os fantasmas em sopros
que afugentam apenas a poeira da velha mobília,
sem desintoxicar meus poros rotos.
Me apego aos ossos em farelos
Negando tacitamente que para as ruas lá fora,
Não passo de naftalina e resto.

Um comentário:

Pedro Lunaris disse...

lindo;

forte & desproporcionado.

não se julga sensações, sempre íntimas em revés. há em mim a sensação de não caber em um poema. mas nesse, há antes... um respeito enorme pelo sentido. que me parece, antes de tudo, franco.

foda fazer beleza de dureza assim.