sábado, 24 de novembro de 2007

Garrafônico

um pouco embriagado
(o suficiente para me sentir francamente lúcido)
me vejo a repensar
imagens destacadas e detidas
no fundo da garrafa

que meus olhos são lentes
que desfocam o mundo
não nego
é o que está fora, de qualquer jeito.

mas que eus encontro
no fundo das lentes
das garrafas de fora?

me pinto ou sou pintada
em gotas diluida
ou em trago tragada?

aguardente ou agua insípida
aguardada ou agourada
suave ou molhada?

veneno, suor, lágrima, gozo
que líquido? que eu?
que reflete?

só sou pelos olhos do que está fora
da minha garrafa,
da que está no chão?
se sim, que faço com a garrafa ainda na mão?

Vida

te deita comigo
nessa troca louca
que me mantém viva
e arfante

me bate, que eu aprendi a gostar
de tantos vezes que tua mao pesada
quebrou meu rosto em pedaços
me deixou marcas
tua marca se faz vida em mim
meu fetiche

aprendi a te amar
apesar de tanta contradição
dor compensada
pelas vezes que se espalha
líquida
pelo meu corpo
e sinto prazer

penetra minha carne fraca
e nao me deixa mais
com força e intensidade
que todo o amor que temos
é tudo que sou

goza, que gozo por te ter
deitada sobre meu corpo
morna e líquida
latejante e semente

arde, Vida
me faz arder e me toma
como tua amante
me embriaga
com o líquido que escorre
do nosso encontro.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

a volta por fora de ser

nao sei o que sou no momento
sei o que fui, o que tinha
sei o que posso ser
mas as possibilidades são
um estupro
a tudo que nao-sou
e nao ser é um estado
absoluto
a pairar
e nao parar!
nao estar
sendo apenas
e no momento apenas nao sou
nao sou isso, nao sou eu
nao sou pedra, papel
nem tesoura
nao te corto, nao te abraço
nao te ofendo
minha boca nao tem veneno
meus passos sao pedaços
e em pedaços sou inteiro.

sábado, 10 de novembro de 2007

Fugas

sentada espero
o oposto
de tudo que faço
e não reverto

ocupo um espaço
de meias passadas
e as fitas atadas
desato

detesto o estrago
e tudo que pesa
se faz certo
no meu encontro

abandono o barco
e a fuga é mais leve
do que deixar pedaços
de corda sem laços

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

do centro

e mais uma vez tudo gira em torno do meu umbigo
mas o útero é claustrofóbico
e o cordão umbilical já se anuncia
nó de forca

dor (er)ótica

mastigar retalhos
e tecer fios inteiros
com a parte de dentro

hora de se despir?
apaga a luz
que tirar os trapos
de cima das feridas
faz arder os olhos

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

being insane
doesnt mean you are insane
it means you feel like
being
something else
that you already was
but that you just
didnt know
yet.

open the doors, please!

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

dos baques da vida

as partes são mais do que o todo
esparramadas
sem nexo
de
ligação.

em peças
te peço
minhas cordas de volta

articulações rangem
sem
comunicação.

domingo, 28 de outubro de 2007

Fragmento

E continuamos a beber.

Beber por quê? Por que beber é bom? O álcool me suga, me esvazia, me alivia, me dramatiza, acentua o traço de vida, borrão quase apagado da minha existência. Me sinto viva, me sinto quase Mrs. Dalloway... me sinto ar. Mas me sinto fogo, Anaïs Nin, me sinto terra, Simone de Beauvoir.... e me sinto água fluida, como... como eu mesma, que passo de um personagem a outro, como num passe de mágica. Me fantasio do que quero, dissimulo, engano a todos, e vou pra casa com um sorriso no rosto - e o coração petrificado.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Trecho

Então aconteceu a primeira noite deles. Com urgência, com a carência de cinco anos de espera. Não foi precedido pelos estímulos do amor em arte, porém entrou para o rol das melhores noites de amor da história. Nessa época já tinham experiência suficiente pra saber que não deveriam falar durante o ato, porém era inevitável não sorrir e gargalhar. Aquilo nem o destino previra. Estavam contrariando a sua história, a sua sorte. E isso traria conseqüências mais eternas do que o próprio amor. De fato o de praxe seria o cheiro de amêndoas amargas se dispersar no ar, invadido pelo cheiro do corpo, da realização. Porém quanto mais se amavam, mais forte o odor dos amores contrariados se tornava. Contrariando todos os sentimentos dele, para ela foi um alívio sentir aquele aroma no ar. Revigorou-se e o amou com mais vontade, pois tinha descoberto que mesmo consumando seu amor na carne, ele sempre seria platônico, digno de uma alma poeta.Ele não acreditava naquele cheiro, pensava ser artimanha dela, sempre tão intrigante, sempre contrariando ele, e mais interessante do que nunca, agora que mulher. O que ele não sabia era que apesar de terem vivido quase as mesmas coisas, ele talvez até um pouco mais, ela realmente tinha aprendido a se entregar, diferente dele. Ela amou outra vez, ela foi feliz, ela sofreu, ela criou eternidades dignas de caixinhas cheias de cadeados, que nem as que tivera com ele. A única diferença era que as dele foram as primeiras. As primeiras amêndoas amargas. O primeiro e, portanto, o último amor de verdade. Mas nunca o único.

Corpo Estendido

O que trago comigo é tão etéreo
Que de dor tão intensa
Rejeitas de pronto
Te vais pela porta e
Me deixas no chão.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

sustentável leveza

que pelos pedaços
de tempos em tempos
se pára
refazendo trapos
de um tecido inteiro
porque a vida voa
e quem diria, é leve.

fisiologias

tão animal
e tão homem ao mesmo tempo
que os instintos
não se encontram com as idéias.

não há comunicação entre as vísceras
e o coração.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

anaïs nin: psicanálise poética?

"Nas múltiplas peregrinações do amor, Sabina era ágil em reconhecer os ecos dos desejos e amores maiores. Os grandes amores, especialmente se nao tivessem tido morte natural, jamais morriam por completo e deixavam reverberações. Uma vez interrompidos, rompidos de maneira artificial, sufocados acidentalmente, eles continuavam a existir em fragmentos separados e pequenos ecos menores.

Uma vaga semelhança física, uma boca quase similar, uma voz levemente parecida, alguma partícula do caráter de Philip, ou de John, emigrariam para um outro que ela reconhecia de imediato em uma multidão, em uma festa, pela ressonância erótica que despertava.

(...)

O corpo continuava vulnerável a certas reproduções, muito tempo depois de a mente acreditar que tenha havido uma separação clara, final".

identificação parcial com o traço do objeto?

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

descartável?

e não sem muito esforço descobri que
não sou de plástico.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

do início.

"Nada temos a temer, exceto as palavras."

Caso Morel, página 13