segunda-feira, 24 de março de 2008

Companhia

Bem-vinda, minha amiga, a esta noite
Não esperava te ver tão cedo
Ou tão tarde.
Puxe uma cadeira, sente-se.
Me ofereça um cigarro e toda a desordem possível.
Agora que te vejo, não me sinto mais tão inquieta
Quando apenas sentia tua presença, tremia.
Mas os tempos já são outros, velha amiga
E hoje tua presença ainda me é incômoda
Porém cordial
Quase como duas velhas senhoras
Se encontrando para lamentar seus mortos
E deixar transparecer pelo silêncio duplo
O inferno da angústia
E a resignação diante das cartas que tiramos
Sem ver futuro.
Não te culpo por me acompanhar a tanto tempo
Creio que te mantive presa aos meus medos
E delírios
Por todos esses anos. Essa longa estrada.
E te temi e desejei tão intensamente...
Não creio que foste uma paixão; creio que
Sempre esperei isso de ti: aceitação.
Me olha nos olhos e me vês
Gasta
Como gasto está o solado de tuas botas
Com as quais peregrinou por tantas vidas
Fazendo visitas insólitas.
Creio que te repudiam quando fracos
Que te apedrejam quando fortes
Mas eu não – abraço todo o desgaste
Que me trazes
Pois reconheço em ti a única amiga
Leal
Que já tive. Nunca me abandonaste;
No teu presente infernal reside a única
Certeza
da minha trajetória.

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